Wednesday, October 10, 2018

slow hands

Ele vai levantar um objecto registado e nota uma ligeira mas suave diferença: a funcionária, outrora fedendo suor barato, exala ora a rosas, transudando saúde. -Senhor a que devo a honra de sua presença? Ele lança-lhe um papel escrevinhado pelo carteiro ad hoc e deixado desleixadamente na sua caixa postal. -A senhora é muito gentil, agradece, chocalhando moedas no bolso. -Agora pode usar-nos como banco postal, senhor! impetrou ela subindo os ombros, enquanto um balão vermelho se desprendia de um fio muito pouco visível e caía no balcão entre ela e ele.

Monday, November 28, 2016

phatal

quando tinha cinco anos mal sabia andar. Por isso marcas várias tenho na cabeça de quedas. Mas as quedas davam-me acesso a uma dimensão paralela que me faziam fazer parar o tempo uns pozinhos antes do momento fatal

Saturday, July 23, 2016

a coisa

quando somos devidamente estimulados, coisas surpreendentes podem acontecer. Era um sábado à tarde, fazia sol, assim como fazia vento e nem por isso, não dispunha de tempo para uma evasiva à ideia de escrever uma obra: De preferência uma obra de arte do artista enquanto de meia-idade. Uma cerveja, um lorenin e uma sandes de chourição e há que teclar, ferindo avidamente dedos virgens de escrita batida em teclado................. (não devia mencionar, mas o primeiro sinal de inspiração veio na forma de um odor a frango assado) ......................................................................................... «Quando se está na primeira infância depois do insistente cheiro a palha de azevém de encher colchões, o cheiro a gato e a cão são omnipresentes. Claro que, excepto nas alturas do pino do verão, com o o cheiro podre do maduro dos figos e com a sensação de atordoamento causadio pelas quedas das figueiras grandes, sempre swingando à nortada( à suivre )

Friday, July 22, 2016

miss Lauryn Hill

https://www.youtube.com/watch?v=MVkqlngs3zw

Friday, April 01, 2016

O Turismo? Que detestável - António Guerreiro

Há um fenómeno da nossa civilização, o mais importante do nosso tempo, que merece ser criticado, pelos efeitos devastadores que tem, mas não é fácil de criticar (e não exactamente por termos de lhe reconhecer também importantes efeitos benéficos). Esse fenómeno é o turismo. Quem mora no centro histórico de uma cidade com grande densidade de turismo (Lisboa já pertence a uma categoria bem situada na escala) acaba por se sentir expatriado e ver dificultados muitos aspectos da sua vida material. Mas a verdade, que ele não ousa confessar a si próprio porque raramente a reconhece, é esta: é que a cidade de que ele se sente expropriado e que ele lamenta perder não é aquela que existia antes do turismo (a essa cidade triste e cristalizada ele nem sonha regressar), mas a cidade formada e conformada ao turismo. O autóctone, no fundo, quer viver nesta condição impossível: numa cidade turística, mas sem turistas, ou numa cidade com turistas mas não turística. O autóctone mais sofisticado, treinado na crítica da ideologia, evita ter uma atitude racista, xenófoba ou de superioridade em relação aos turistas, mas esse cuidado é difícil de manter porque estes acabam por o irritar. Se não o irritam pelo que são e fazem, irritam-no pelo que significam. É que, involuntariamente, e sem o saberem, restituem-lhe, como um espelho, a imagem que ele deu a autóctones como ele nos momentos e nos lugares em que foi turista. O autóctone que se sente denunciado a si próprio é porque tem um alto grau de autoconsciência e pode decidir nunca mais fazer turismo, decisão que só vai agravar o seu ódio silencioso aos turistas. Já que as viagens não lhe estão reservadas em exclusivo, como ele implicitamente reclama, o melhor é desistir delas. Ele é um desencantado do turismo, mas não daquele desencantamento que quase todo o turista conhece, quando se dá conta de que a sua maravilhosa viagem serviu para lhe inocular o vazio e o tédio e tudo o que lhe estava prometido não passa de uma fraude. Pode ser que o autóctone mais ou menos culto, procurando ler teorias e histórias do turismo (um género muito menos abundante do que os livros de viagens), descubra num livro de um escritor alemão muito conservador, chamado Gerhard Nebel, um excerto onde se dizem coisas que só um alemão contemporâneo de Heidegger consegue dizer: “O turismo ocidental é um dos maiores movimentos nihilistas, uma das grandes epidemias do Ocidente, que no seu grau de nocividade está apenas abaixo das epidemias do Centro e do Leste, mas ultrapassa-as em silenciosa perfídia. Os enxames dessas bactérias gigantes chamadas turistas recobrem as substâncias mais diversas da viscosidade uniformemente cintilante que dá pelo nome de Thomas Cook, de maneira que acabam por não distinguir bem o Cairo de Honolulu e Taormina de Colombo”. E, a rematar, Nebel, que não conheceu o turismo de massas actual, tem uma frase que parece vir do círculo sinistro do grande vate Stefan George, onde se celebrava poeticamente uma “Alemanha secreta”: “Um país que se abre ao turismo fecha-se metafisicamente – oferece um cenário, mas já não a sua mágica potência”. O problema é que esta denúncia do turismo é apenas mais enfática e empolada do que aquelas que são produzidas com frequência. Mas, tirando isso, há um ar de família neste discurso. O autóctone insensível aos fechamentos metafísicos continua ainda assim com uma enorme vontade de fazer uma crítica do turismo. Este bem merece, e muito, mas não é fácil. Mal começa a fazê-la, o autóctone já está a cair em armadilhas. Até por isto o turismo é um fenómeno detestável.

Wednesday, March 23, 2016

objecto registado

Vou evantar um objecto registado e noto uma ligeira mas suave diferença: a funcionária, outrora fedendo suor barato, daquele do povão, exala a cheiro de rosas, transudando saúde. -Senhor a que devo a honra de sua presença? Lanço-lhe um cartãozinho escrevinhado que o carteiro deixou na minha box postal. -A senhora é muito gentil, agradeço eu, chocalhando moedas no bolso. -Agora pode usar-nos como banco postal, senhor! impetrou ela subindo os ombros, enquanto um balão vermelho se desprendia de um fio invizível e caía no balcão entre ela e eu...

Wednesday, June 24, 2015

Curt Smith

Congrats Curt Smith! Há 30 anos esta música era nº 1 em quase todas as charts. https://www.youtube.com/watch?v=Ye7FKc1JQe4